Perto da faculdade, longe de casa
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Por si só, terminar o colégio e entrar na faculdade já é uma grande mudança, cheia de desafios. Para quem ingressa em um curso longe de casa, a mudança é mais drástica. Não troca só de escola, como de quarto, de horários, de amigos. A galera da república da Zuleide, na Malhação, passa por apuros diários! Será que na vida real é assim?
Sem questionar se estava preparado ou não, Marcos Vinicius Aguiar, 18 anos, de Araguaína, no Tocantins, decidiu estudar fora. Optou pelo curso de Tradutor e Intérprete, passou, fez as malas e avisou a mãe que estava de mudança. Depois de 36 horas de ônibus, chegou em São Bernardo. Logo conseguiu uma república, com a qual divide com cinco pessoas. “Fiquei com medo de morar com estranhos, mas dei sorte.”
O garoto jura que sabe se virar bem. “Aprendi a lavar, passar e cozinhar. Mesmo assim, contamos com a ajuda de faxineira.” Apesar da saudade da família e da comida da mamãe, ele acredita que está vivendo uma experiência importante. “Mesmo sem conforto, é uma nova fase da vida. Sei que vou aprender muito.”
Vitor José Lima e Silva, 20, de Santo André, fez o caminho inverso. Passou no vestibular para Medicina Veterinária e se mudou para Pirassununga, no interior de São Paulo. “Minha mãe veio comigo para fazer a matrícula e ver onde ia morar”, conta o garoto, que divide uma casa com 11 caras. “O pessoal parece ser legal, mas, como bicho, tenho de fazer as tarefas. Pelo menos, sei fritar ovo.”
Na opinião de Vitor, o mais difícil é ficar longe da família, dos amigos e da namorada. “Terei de voltar sempre para vê-los e também aprender a controlar a saudade. Acho que estou fazendo a coisa certa.”
Capital das repúblicas – Onde há faculdade, pode apostar que há república por perto. As mais famosas são as de Ouro Preto, em Minas Gerais, que serviram de inspiração para a novela Coração de Estudante (2002), da Globo. Os primeiros relatos de alojamentos estudantis por lá são do fim do século 19, quando a cidade abrigava as Escolas de Minas e Farmácia, duas tradicionais instituições de ensino que foram integradas em 1969, dando origem à Ufop (Universidade Federal de Ouro Preto). Ainda hoje muitas repúblicas pertencem à própria universidade.
República Big Brother
Ok. Morar fora pode ser ótima experiência de vida, oportunidade para conhecer gente nova, se divertir e tudo mais. O duro é fazer isso focado no objetivo principal: mandar bem na faculdade! Para garantir que vai rolar tudo direitinho, alguns pais procuram por repúblicas que conseguem manter a mínima ordem entre seus hóspedes. Elson Napário, 20, mora em uma delas. “Somos 18 homens na mesma casa. Imagina a bagunça que seria se não tivessem regras. Cada um tem de respeitar o espaço do outro”, afirma.
A dona da república do Elson cuida deste tipo de negócio há 16 anos. Controla o andamento de tudo por meio de câmeras, instaladas em vários pontos da casa (com o consentimento dos moradores). Além disso, entrevista os pais e cada aluno antes de aceitá-lo.
“Analiso o jeito da família. Deixo claro que se desrespeitar as regras, é convidado a se retirar na hora. O objetivo é ter um bom local para morar e estudar”, esclarece a responsável pela república, que prefere não se identificar.
Não levar amigos – muito menos meninas – é uma das principais regras. Além disso, cada um deve cuidar da própria comida e roupa. Elson não gosta disso, mas respeita. “Claro que gostaria de convidar amigos e também ter tudo pronto em casa, mas sei que é só uma fase. Dá para viver muito bem.” Em compensação, duas funcionárias cuidam da organização e cada hóspede tem direito a um ponto de internet e uma chave da casa.
“A convivência aproxima os estudantes, que se tornam amigos mesmo. Todos sabem que se sentirem sozinhos, podem conversar comigo também. Já aconteceu muitas vezes”, conta a dona da república.
Muda a vida mesmo!
A entrada na faculdade é a principal passagem da vida adolescente para a adulta. Não é a toa que a gente estranha. “É complicado estabelecer novas relações. Nos Estados Unidos isso é mais comum do que no Brasil. Lá eles se viram mais cedo”, diz Leila Tardivo, professora do Insituto de Psicologia da USP.
Nos Estados Unidos é frequente os estudantes morarem em alojamentos dentro da própria universidade. Muitos filmes de ‘sessão da tarde” mostram, inclusive, briguinhas entre cada ‘clã” (ou fraternidades) e invasão de meninos e meninas no quarto um do outro, como em Ela e os Caras e American Pie, por exemplo.
Nas repúblicas brasileiras a bagunça não é tão escrachada, mas é preciso disciplina e força de vontade para aprender a conciliar tudo de bacana que a faculdade oferece – como festas, badalação, amizades – com o objetivo principal, que é estudar, fazer estágio e se formar. “Tem quem presta vestibular longe de casa porque quer se livrar da cobrança dos pais. Isso pode ser um grande problema.”
Peça ajuda – Leila Tardivo afirma que, para passar por essa fase sem traumas, o estudante não pode ter vergonha de falar o que sente. “Ninguém nasce sabendo. Quem está entrando no curso agora deve ter as mesmas dúvidas que os veteranos tiveram. Portanto, é preciso ficar tranquilo e aproveitar.”
Tem gente que se deprime, mas quem consegue superar a saudade vive uma experiência única. “É um novo mundo que se abre. A oportunidade perfeita para mostrar quem se é de verdade. Além do mais, não precisa ser definitivo.”
Depois, no término do curso, chega a hora de decidir o contrário, o que cada um quer fazer. “Conheço quem volta para os pais e quem curtiu tanto a liberdade que está pronto para seguir a vida.”
Conselho de veteranos
É normal se sentir deslocado, ansioso e até triste quando rola uma grande mudança na nossa vida. No começo, é um pouquinho complicado se adaptar mesmo, mas quem passou por isso, garante que é possível se acostumar e curtir a experiência para toda a vida.
Anderson Cândido, 23, é carioca e mora em república há três anos. “No começo foi mais difícil, sentia muitas saudades de casa. Com o tempo, acabei construindo uma vida aqui. Sei que não vou conseguir mais morar com a família depois que a facu terminar. Gosto de ser independente.”
Fernanda Martins, 22, de Santos, também aprendeu a se virar sozinha, mas quando se mudou, ficou meio perdida. “É complicado sim. Dá saudade de ter cama arrumada, jantar pronto, o colo dos pais quando o dia é estressante, mas é a vida. Escolhi isso”, conta a garota, que passou certos apuros por ter de dividir o espaço, sempre com meninas. “Já rolou brigas e desentendimentos. É complicado lidar com os hábitos de outra pessoa. Cada um tem um jeito, foi criado de forma diferente. Não acabo ficando à vontade, como em casa, mas é o jeito.”
Para não criar problemas, a turma de Fernanda divide as despesas da casa (como aluguel, luz e água) em partes iguais. Além disso, cada uma paga a sua conta de telefone. As tarefas de limpeza também são divididas e fica combinado que pode levar os namorados, mas sempre com respeito, claro. “Com o tempo aprendi a ter mais paciência, ser mais tolerante e a não me incomodar com besteiras. Também é divertido; por isso, recomendo morar sozinha.”
Para se adaptar bem
Muitas dicas servem para quem já está na república, outras para quem vai viver essa experiência em breve:
O primeiro passo é investigar se há alojamentos na própria faculdade (isso ocorre com algumas públicas) ou se a instituição oferece bolsa-moradia (para quem recebe até dois salários-mínimos).
Faça uma visita com seus pais nas repúblicas com vagas. Pesquise na própria faculdade e nos sites de relacionamento. O importante é ver de perto como é o lugar e quem vive lá.
Depois de decidir onde morar, procure saber onde ficam o dentista, a farmácia, o hospital, a padaria, o supermercado, a rodoviária.
Providencie uma conta universitária na agência do campus. Assim fica mais fácil receber a mesada ou depositar o próprio salário.
Reúna os habitantes do novo lar e defina as regras da república, o espaço de cada um – até na geladeira – e a rotina da casa.
Divida as tarefas domésticas. Uma boa dica é fazer um plano de atividades em que todos revezem a função.
Se perceber que vai rolar confusão por causa disso, estude a possibilidade de contratar uma faxineira.
Divida as despesas em partes iguais e defina o responsável pelos pagamentos.
Reserve um valor para as compras de produtos de limpeza e de uso comum.
E o mais importante: tenha bom-senso e respeite o colega como gostaria de ser respeitado. Sua mãe já diz isso!
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