Profissões do século passado
Certas
profissões nunca deixarão de existir. Médicos,
advogados, padeiros, lixeiros,
secretarias, são profissões altamente necessárias para nossa
sociedade. No entanto, creio que mudanças deverão ocorrer…médicos virtuais
especializados em genética por exemplo…ou padeiros especializados em
micro-ondas … ou talvez …secretarias eletrônicas ou digitais ….e assim
por diante.
A
experiência que adquiri através da observação da história do cotidiano em
quase um século, faz-me concluir que algumas
profissões se reciclam ao longo do tempo, e devemos estar preparados
para isso…outras porem, simplesmente desaparecem…como se nunca houvessem
existido.
Por
aí podemos perceber como tudo é tão efêmero…e passa rápido…Muitas
vezes, alguém que se vangloria tanto de sua profissão, depois de algum tempo
se torna tão irrelevante que ela acaba esquecida em algum canto de nossa memória…
Vejamos
algumas profissões do século passado.
Meu
sogro, italiano , é um exemplo: logo ao chegar da Itália e se instalar com a família na Bela Vista, teve o grande orgulho em tirar
sua primeira carteira de habilitação no Brasil. Sua profissão : cocheiro.
Isso mesmo, andava pela cidade , devidamente habilitado e autorizado, guiando
sua carroça pelas ruas de paralelepípedos do Itaim, do Centro, de Santo Amaro,
Santana, Brás, Bexiga, aonde houvesse transporte …
Por
inúmeras vezes , de 1930 a 1932, ao ir estudar na Rua da Glória no Colégio São
José, avistei as tropas de burros dos cocheiros, descansando, estacionadas
no centro da cidade de SP. Havia um enorme chafariz no Largo do Piques onde hoje
está a Praça da Bandeira e ali os animais ficavam tomando água . Era ponto
de encontro dos carroceiros e das charretes, na verdade fazendo uma analogia, o local tinha a mesma função que hoje tem : um terminal de
transportes. Chamava a minha atenção, quando ao caminhar pela Rua Riachuelo,
avistava os cavalos e burros ali parados… mas a cidade já começava a se
modificar e novos meios de transportes iriam se impor aos paulistanos. Aquela
imagem que avistava iria desaparecer, porem
não da minha memória.
A
atividade profissional de meu sogro durou pouco e ele se
tornou dono de uma padaria aqui no Itaim. Sua profissão já estava
desaparecendo..assim como a dos
motorneiros de bondes que costumavam dirigir sempre brincando e fazendo
barulho…Havia até uma pequena melodia em homenagem a eles: Seu condutor, din
din , seu condutor din din pare esse bonde pra descer o meu amor…
E
novas profissões começavam a estar na moda. Eu mesma , quando cursava o último
ano da escola, me preocupei em fazer um curso que fosse atual: datilografia. Fui
estudar no Instituto XV de novembro
bem no centro . Hoje quando vejo minhas filhas e netas digitando o teclado do
computador, comparo com os
ensinamentos que aprendi no antigo curso. Imaginem que nós aprendíamos desde
colocar e retirar o papel na máquina até decorar as teclas, fazer correção
de palavras , alterar tipo de letras,
dar espaços e parágrafos , tudo
feito manualmente e com muita atenção…digitar, desculpem, datilografar com
rapidez era essencial para ser devidamente diplomada com um lindo enorme
certificado com o nome escrito ou melhor, desenhado a nanquim. Foi com muito
orgulho que recebi o meu diploma.
Hoje os programas de computador fazem tudo para nós…ficou fácil
demais…perdeu-se o encanto…
Uma
das profissões mais românticas e interessantes que eu tive oportunidade de
apreciar foi o acendedor de lampiões de gás…Na rua Augusta onde eu morei de
1918 a 1924, os acendedores eram
figuras obrigatórias…eles vinham caminhando pela rua tanto para acender o
lampião ao cair da noite como para o apagar ao amanhecer do novo dia.
Carregavam um grande bastão com
uma ponta em forma de funil e costumavam avisar
a hora gritando “São seis
horas!”. Depois que me mudei para o Itaim, nunca mais vi um acendedor de lampiões…Ficou
só a velha letra da música: Lampião de gás, lampião de gás, quantas
saudades você me trás! ….
Outra
profissão que testemunhei o desaparecimento foram os lambe-lambes…esses fotógrafos
de rua que encontrávamos em todas as praças da cidade. Todo o povo comprava
suas fotos que eram tiradas ali mesmo, na rua, e reveladas imediatamente…não
sei o método que usavam, mas após
a foto ser registrada e o inevitável
“Sorria” acontecer, eles retiravam uma grande chapa de dentro da caixa e a
colocavam atrás, a escondendo com
um pano preto e…a foto em branco e preto estava
pronta… fácil e rápido…parece até “coisa do século XXI”!
E
o médico de família…Ah… esse era nosso amigo, quase sempre nem cobrava sua
visita que era acompanhada com um
cafezinho, bolo de fubá ou até
mesmo um almoço…era amigo de verdade, preocupado
com nosso bem estar e nos conhecia por inteiro e em detalhes…o resultado era
surpreendente…quase sempre suas orientações eram felizes e corretas.
Os
profissionais para serviços domésticos eram comuns nos bairros e muito
competentes: marceneiros, serralheiros, encanadores, vidraceiros, pintores,
eletricistas… eram pessoas da comunidade que nos atendiam com
amabilidade e atenção por um custo justo e correto…Não precisávamos
nem da existência do Procon… a consciência de cada profissional era o
controle de qualidade do atendimento.
E a costureira, então
…hoje são poucas e restritas a trabalhar para grandes confecções e lojas.
Aquela máquina de costura que era obrigatória em cada casa de família , hoje
é peça de museu…as mulheres não costuram mais e perdem a oportunidade de
fazer economia evitando comprar
roupas feitas, sem qualidade . Costurar era uma profissão imprescindível
na formação da boa dona- de- casa ou da jovem de família , assim como a
bordadeira, a tecelã, a crocheteira e a tricoteira. Profissões que deveriam
ser resgatadas e divulgadas novamente às nossas jovens, dando mais uma
oportunidade profissional para elas.. Por que
não ensiná-las nas escolas públicas
dando uma opção e uma formação
de bom gosto e lucro certo? .
Atualmente os produtos feitos a partir do trabalho manual são muito bem
valorizados, em detrimento da alta industrialização que massifica a qualidade.
Poderia
ficar aqui descrevendo mais e mais profissões do
século passado…mas ainda teremos
outras oportunidades de voltar ao assunto. Seja qual for a profissão, ela sempre será importante para a sociedade, mesmo as que já desapareceram,
pois elas foram criadas pela necessidade
da comunidade e desempenharam seu
papel naquele momento em que existiram. Dessa forma contribuíram para a formação
da sociedade em que vivemos hoje.
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