Literatura de Informação
O Quinhentismo ou Literatura de Informação
corresponde ao estilo literário que abrange todas as manifestações
literárias produzidas no Brasil à época de seu descobrimento, durante o
século XVI. É um movimento paralelo ao Classicismo português e possui
idéias relacionadas ao Renascimento, que vivia o seu auge na Europa.
Aliteratura de Informação tem como tema central os próprios objetivos da
expansão marítima: a conquista material, na forma da literatura
informativa das Grandes Navegações, e a conquista espiritual,
resultante da política portuguesa da Contra-Reforma e representada pela
literatura jesuítica da Companhia de Jesus.
Aliteratura informativa, também chamada de literatura dos viajantes ou
dos cronistas, consiste em relatórios, documentos e cartas que
empenham-se em levantar a fauna, flora e habitantes da nova terra, com
o objetivo principal de encontrar riquezas, daí o fato de ser uma
literatura meramente descritiva e de pouco valor literário.
A exaltação
da terra exótica e exuberante seria sua principal característica,
marcada pelos adjetivos, quase sempre empregados no superlativo. Esse
ufanismo e exaltação do Brasil seria a principal semente do sentimento
nativista, que ganharia força no século XVII. durante as primeiras
manifestações contra a Metrópole
A Carta de Pero Vaz de Caminha ACarta a el-rei D. Manuel sobre o achamento do Brasil, popularmente
conhecida como Carta de Pero Vaz de Caminha, é o documento no qual Pero Vaz de Caminha registrou as suas impressões sobre a terra que posteriormente viria a ser chamada de Brasil. É o primeiro documento escrito da história do Brasil sendo, portanto, considerado o marco inicial da obra literária no país.
Escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral, Caminha redigiu a carta para o rei D. Manuel I (1495-1521) para comunicar-lhe o descobrimento das novas terras. Datada de Porto Seguro, no dia 1 de Maio de 1500, foi levada a Lisboa por Gaspar de Lemos, comandante do navio de mantimentos da frota.
Trechos Comentados da Carta de Pero Vaz de CaminhaEssa carta foi escrita na forma de um relato da viagem do descobrimento do Brasil.
No
texto abaixo, cópia fiel da carta de Caminha, são apontados e
comentados (em letra de tipo, tamanho e cor diferentes da carta) alguns
trechos em que o narrador fala da viagem, da terra, suas riquezas, seu
povo …. Vale a pena verificar como foi descrito o Brasil no momento
da descoberta. É importante pensar sobre o que mudou desde então.
Posto
que o Capitão-mor dessa Vossa Frota, assim como os outros capitães
escrevam a Vossa Alteza a notícia do achamento dessa Vossa terra nova
que agora nesta navegação se achou, não deixarei de também dar disso
minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que –
para o bem contar e falar – o saiba fazer pior que todos.
Entretanto,
tome Vossa Alteza minha ignorância por boa vontade, a qual bem certo
creia que, para aformosear nem afear, aqui não se há de pôr mais do que
aquilo que vi e me pareceu. Nestes
2 primeiros parágrafos de sua carta Caminha explica seu objetivo com
ela: dar conta ao rei do ocorrido, sendo fiel aos fatos, sem
acrescentar ou tirar nada.
Da marinhagem e das singraduras do
caminho não darei aqui conta a Vossa Majestade – porque não saberei
fazer e os pilotos devem ter este cuidado – e portanto, Senhor, do que
hei de falar começo e digo. Que a partida de Belém foi como Vossa
Alteza sabe, segunda- feira, 9 de março. E sábado, 14 do dito mês,
entre as 8 e 9 horas, nos achamos entre as Canárias, mais perto da
grande Canária. E ali andamos todo aquele dia em calma, à vista delas,
cerca de 3 ou 4 léguas.
E domingo, 22 do dito mês, às 10 horas pouco
mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo Verde, ou melhor, da
ilha de São Nicolau, segundo o dito de Pero Escolar, piloto. Na noite
seguinte, à segunda-feira, quando amanheceu, se perdeu da frota Vasco
de Ataíde com sua nau, sem haver tempo forte ou contrário para isso
poder acontecer. Fez o Capitão suas diligências para o achar, em umas e
outras partes, mas ele não apareceu mais. Nos
3 parágrafos seguintes (acima) Caminha relata brevemente o desenrolar
da viagem até que, a partir do parágrafo 6 começà o relato do
descobrimento e exploração do Brasil.
A intenção de explorar as riquezas materiais da terra.
Viuum deles umas contas de rosário brancas; acenou que lhes dessem, e
folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço; e depois tirou-as e
enrolou-as no braço e acenou para a terra e de novo para as contas e
para o colar do Capitão, como que dariam ouro por aquilo. Isto
tomávamos nós nesse sentido, por assim o desejarmos. Mas se ele queria
dizer que levaria as contas e mais o colar, isto não queríamos nós
entender porque não lho havíamos de dar.
Estes2 parágrafos que vêm a seguir tratam dos primeiros sinais de terra e da
primeira vista de terra que tiveram: o Monte Pascoal.
Eassim seguimos nosso caminho por este mar de longo, até que,
terça-feira das Oitavas de Páscoa que foram 21 dias de abril, topamos
alguns sinais de terra sendo da dita ilha distante, segundo os pilotos
diziam, obra de 660 a 670 léguas, os quais eram muita quantidade de
ervas compridas, a que os mareantes chamam botelho e assim outros a que
também chamam de rabo-de-asno.
E na quarta-feira seguinte, pela manhã
(22 de abril de 1500), topamos aves a que chamam fura-buchos e, neste
mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra. A saber,
primeiramente, de um grande monte, muito alto e redondo e de outras
serras mais baixas ao sul dele e de terra chã, com grandes arvoredos;
ao qual monte alto o Capitão pôs o nome de Monte Pascoal e, à terra,
Terra de Vera Cruz.
Mandou lançar o prumo e acharam 25 braças e ao
sol-posto, a cerca de seis léguas da terra, lançamos âncora em 19
braças – ancoragem limpa. Ali ficamos ancorados toda aquela noite. E à
quinta-feira [23 de abril], pela manhã, fizemos vela e seguimos
direitos à terra, os navios pequenos adiante indo por 17, 16, 15, 14,
13, 12, 10 e 9 braças até meia légua da terra, onde todos lançamos
âncora em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às
dez horas pouco mais ou menos e dali avistamos homens que andavam pela
praia, cerca de sete ou oito, segundo os navios pequenos disseram, por
chegarem primeiro.
Ali lançamos fora os batéis e esquifes. E vieram
logo todos os Capitães das naus a esta nau do Capitão-mor e ali
conversaram. E o Capitão mandou no batel em terra a Nicolau Coelho para
ver aquele rio. E assim que ele começou a ir para lá, acudiram pela
praia homens, aos dois ou aos três, de maneira que quando o batel
chegou à boca do rio, já havia ali 18 ou 20 homens. Neste ponto Caminha
começa a descrever a população local, os índios, e seus primeiros
contatos com os portugueses. Pardos, nus, sem coisa alguma que lhes
cobrisse suas vergonhas, traziam arcos nas mãos e suas setas.
Vinham
todos rijos em direção ao batel e Nicolau Coelho fez sinal para que
pousassem os arcos, e eles pousaram. Ali não pode deles haver fala nem
entendimento que aproveitasse, por o mar quebrar na costa. Somente lhes
deu um barrete e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um
sombreiro preto. E um deles lhe deu um sombreiro de penas de aves,
compridas, com uma copazinha pequena de penas vermelhas e pardas como
de papagaio, e outro lhe deu um ramal grande de continhas brancas,
miúdas, que querem parecer de algaveira, as quais peças creio que o
Capitão manda a Vossa Alteza.
E com isto se volveu às naus por ser
tarde e não poder haver deles mais falas por causa do mar. A noite
seguinte ventou tanto sueste com aguaceiros que fez caçar as naus e
especialmente a capitânia. E sexta pela manhã [24 de abril], às oito
horas, pouco mais ou menos, por conselho dos pilotos, mandou o Capitão
levantar âncoras e fazer vela.
E fomos ao longo da costa, com os batéis
e esquifes amarrados pela popa, em direção ao norte, para ver se
achávamos alguma abrigada e bom pouso onde ficássemos para tomar água e
lenha.Não por nos já minguar mas por nos acertarmos aqui. E quando
fizemos vela, seriam já na praia, assentados perto do rio, cerca de 60
ou 70 homens que se juntaram ali pouco a pouco.
Fomos de longo, e
mandou o Capitão aos navios pequenos que fossem mais chegados à terra e
que achassem pouso seguro para as naus, que amainassem. Aqui Caminha
conta um pouco das primeiras explorações da terra recém descoberta. E
velejando nós pela costa, cerca de 10 léguas donde tínhamos levantado
ferro, acharam os ditos navios pequenos um recife com um porto dentro,
muito bom e muito seguro, com uma mui larga entrada.
E meteram-se
dentro e amainaram. E as naus arribaram sobre eles e um pouco antes do
sol posto, amainaram cerca de uma légua do recife e ancoraram em 11
braças. E estando Afonso Lopes, nosso piloto, em um daqueles navios
pequenos, por mandado do Capitão, por ser homem vivo e destro para
isso, meteu-se logo no esquife a sondar o porto dentro.
E tomou em uma
almadia dois daqueles homens da terra – mancebos e de bons corpos – e
um deles trazia um arco e seis ou sete setas. E na praia andavam muitos
com seus arcos e flechas, mas não os aproveitaram. Trouxe-os logo, já
de noite, ao Capitão, em cuja nau foram recebidos com muito prazer e
festa.
Nestes 2 próximos parágrafos os índios são descritos com mais
detalhes. A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de
bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus sem nenhuma
cobertura. Não fazem caso de cobrir ou mostrar suas vergonhas. E o
fazem com tanta inocência como mostram o rosto.
Ambos traziam os beiços
de baixo furados e metidos por eles ossos brancos verdadeiros do
comprimento de uma mão travessa, e da grossura de um fuso de algodão,
agudo na ponta como um furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço
e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feito como
roque-de-xadrez. E de tal maneira o trazem ali encaixado que não magoa
nem lhes estorva a fala, nem comer, nem beber.
Os seus cabelos são
corredios e andavam tosquiados, de tosquia alta mais do que
sobre-pente, de boa grandura e rapados até para cima das orelhas. E um
deles trazia por baixo da solapa, de fonte a fonte, para detrás, numa
maneira de cabeleira de penas de ave amarela que seria do comprimento
de um coto, mui basta e mui cerrada, que lhe cobria o toutiço e as
orelhas. E andava pegada aos cabelos, pena por pena, com uma confeição
branda como cera, mas não era cera, de maneira que andava a cabeleira
mui redonda e mui basta e mui igual e não fazia míngua mas lavagem para
a levantar.
Os próximos parágrafos falam sobre o comportamento dos
nativos quando do contato com os brancos.O Capitão, quando eles vieram,
estava sentado em uma cadeira, e uma alcatifa aos pés por estrado; e
bem vestido, com um colar de ouro mui grande ao pescoço. E Sancho de
Tovar e Simão de Miranda e Nicolau Coelho e Aires Correia e nós outros
que aqui na nau com ele íamos, assentados no chão, nessa alcatifa.
Acenderam tochas e eles entraram e não fizeram nenhuma menção de
cortesia, nem de falar ao Capitão nem a ninguém. Porém um deles pôs
olho no colar do Capitão a acenar com a mão para a terra, e depois para
o colar, como que nos dizendo que havia em terra ouro.
E também viu um
castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e então para o
castiçal como que havia lá também prata. Mostraram-lhes um papagaio
pardo que o Capitão traz consigo. Tomaram-no logo nas mãos e acenaram
para a terra como que dizendo haver deles ali. Mostraram-lhes um
carneiro e não fizeram caso dele. Mostraram-lhes uma galinha, quase
tiveram medo dela e não lhe queriam por a mão, depois a tomaram mas
como espantados.
Nos 3 próximos parágrafos Caminha faz uma conclusão bem otimista da carta “…dar-se-á nela tudo, …” Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que
mais vimos contra o sul, até outra ponta que vem contra o norte, de que
nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte
ou vinte e cinco léguas por costa. Traz ao longo do mar, em algumas
partes grandes barreiras, delas vermelhas e delas brancas, e a terra
por cima toda chã e muito cheia de grandes arvoredos, de ponta a ponta
é toda praia plana muito chã e muito formosa. Sobre o sertão, nos
parece, do mar, muito grande porque, a estender olhos, não podíamos ver
senão terra e arvoredo, que nos parecia mui longa terra.
Nela, até
agora, não podemos saber que haja ouro, nem prata, nem nenhuma coisa de
metal, nem ferro lho vimos. Mas, a terra em si, é de muitos bons ares,
frios e temperados como os de Entre-Doiro e Minho, porque neste tempo
de agora, assim os achávamos, como os de lá. Águas são muitas,
infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo a aproveitar,
dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem. Mas, o melhor
fruto que nela se pode fazer, me parece, que será salvar esta gente, e
esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza nela deve lançar.
A intenção de aculturar os indios para a fé católica (…)Acabadaa missa, desvestiu-se o padre e pôs-se em uma cadeira alta e nós todos,
lançados por essa areia, e pregou uma solene e proveitosa pregação da
história do Evangelho e, ao fim dela, tratou da nossa vinda e do
achamento desta terra, conformando-se com o sinal da cruz, sob cuja
obediência viemos e que veio muito a propósito e fez muita devoção.
(….) Esegundo o que a mim e a todos pareceu, esta gente não lhe falece outra
coisa para ser cristã, senão entenderem-nos, porque assim tomavam
aquilo que nos viam fazer como nós mesmo, por onde pareceu a todos que
nenhuma idolatria nem adoração têm. E bem creio que, se Vossa Alteza
aqui mandar quem mais entre eles devagar ande, que todos seriam
tornados ao desejo de Vossa Alteza. E, para isso, se alguém vier, não
deixe logo de virem cléricos para os batizar porque já então terão mais
conhecimento de nossa fé pelos dois degredados que aqui entre eles
ficam, os quais, ambos, hoje também comungaram.
Entre todos estes que
hoje vieram, não veio mais que uma mulher moça, a qual esteve sempre à
missa, a quem deram um pano com que se cobrisse e puseram-lho ao redor
de si. Mas ao assentar não fazia memória de o muito entender para se
cobrir. Assim, Senhor, que a inocência desta gente é tal que a de Adão
não seria mais, quanto à vergonha. Ora veja Vossa Alteza, quem em tal
inocência vive, ensinando-lhes o que para sua salvação pertence, se se
converterão ou não?
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