Trovadorismo
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Panorama histórico
Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa.
Esse movimento literário compreende o período que vai, aproximadamente
do século XII ao século XIV.
A partir desse século, Portugal começava a afirmar-se como
reino independente, embora ainda mantivesse laços econômicos,
sociais e culturais com o restante da Penínsua Ibérica. Desses
laços surgiu, próximo à Galícia (região
ao norte do rio Douro), uma língua particular, de traços próprios,
chamada galego-português. A produção literária
dessa época foi feita nesta variação linguística.
A cultura trovadoresca refletia bem opanorama histórico desse período:
as Cruzadas, a luta contra os mouros, o feudalismo, o poder espiritual do
clero.
O período histórico em que surgiu o Trovadorismo
foi marcado por um sistema econômico e político chamado Feudalismo,
que consistia numa hierarquia rígida entre senhores: um deles, o suserano,
fazia a concessão de uma terra (feudo) a outro indivíduo, o
vassalo. O suserano, no regime feudal, prometia proteção ao
vassalo como recompensa por certos serviços prestados.
Essa relação de dependência entre suserano e vassalo
era chamada de vassalagem.
Assim, o senhor feudal ou suserano era quem detianha o poder, fazendo a concessão
de uma porção de terra a um vassalo, encarregado de cultivá-la.
Além da nobreza (classe que pertenciam os suseranos) e a classe dos
vassalos ou servos, havia ainda uma outra classe social: o clero. Nessa época,
o poder da Igreja era bastante forte, visto que o clero possuía grandes
extensões de terras, além de dedicar-se também à
política.
Os conventos eram verdadeiros centros difusores da cultura medieval, pois
era neles que se escolhiam os textos filosóficos a serem divulgados,
em função da moral cristã.
A religiosidade foi um aspecto marcante da cultura medieval portuguesa. A
vida do povo lusitano estava voltada para os valores espirituais e a salvação
da alma. Nessa época, eram frequentes as procissões, além
das próprias Cruzadas – expedições realizadas durante
a Idade Média, que tinham como principal objetivo a libertação
dos lugares santos, situados na Palestina e venerados pelos cristãos.
Essa época foi caracterizada por uma visão teocêntrica
(Deus como o centro do Universo). Até mesmo as artes tiveram como tema
motivos religiosos. Tanto a pintura quanto a escultura procuravam retratar
cenas da vida de santos ou episódios bíblicos.
Quanto à arquitetura, o estilo gótico é o que predominava,
através da construção de catedrais enormes e imponentes,
projetadas para o alto, à semelhança de mãos em prece
etntanto tocar o céu.
Na literatura, desenvolveu-se em Portugal um movimento poético chamado
Trovadorismo.
Os poemas produzidos nessa época eram feitos para serem cantados
por poetas e músicos. (Trovadores – poetas que compunham a letra e
a música de canções. Em geral uma pessoa culta – Menestréis
– músicos-poetas sedentários; viviam na casa de um fidalgo,
enquanto o jogral andava de terra em terra – , Jograis – cantores e tangedores
ambulantes, geralmente de origem plebéia – e Segréis – trovadores
profissionais, fidalgos desqualificados que iam de corte em corte, acompanhados
por um jogral) Recebiam o nome de cantigas, porque eram acompanhados por instrumentos
de corda e sopro. Mais tarde, essas cantigas foram reunidas em Cancioneiros:
o da Ajuda, o da Biblioteca Nacional e o da Vaticana.
A poesia medieval portuguesa
A produção poética medieval portuguesa pode ser agrupada
em dois gêneros:
Gênero lírico
Em que o amor é a temática constante, são as cantigas
de amor e as cantigas de amigo.
A canção da Ribeirinha
(Esta cantiga de Paio Soares de Taveirós é considerada o mais
antigo texto escrito em galego-português: 1189 ou 1198, portanto fins
do século XII. Segundo consta, esta cantiga teria sido inspirada por
D. Maria Pais Ribeiro, a Ribeirinha, mulher muito cobiçada e que se
tornou amante de D. Sancho, o segundo rei de Portugal. )
“No mundo nom me sei parelha, / mentre me for’ como me vai, / ca ja
moiro por vos – e ai / mia senhor branca e vermelha, / queredes que vos retraia
/ quando vos eu vi em saia! / Mao dia que me levantei, que vos enton nom vi
fea! “
No mundo ninguém se assemelha a mim / enquanto a minha vida continuar
como vai / porque morro por ti e ai / minha senhora de pele alva e faces rosadas,
/ quereis que eu vos descreva (retrate) / quanto eu vos vi sem manto (saia
: roupa íntima) / Maldito dia! me levantei / que não vos vi
feia (ou seja, viu a mais bela).
“E, mia senhor, des aquel di’ , ai! / me foi a mim muin mal, / e vós,
filha de don Paai / Moniz, e ben vos semelha / d’aver eu por vós guarvaia,
/ pois eu, mia senhor, d’alfaia / nunca de vós ouve nem ei / valia
d’ua correa”.
E, minha senhora, desde aquele dia, ai / tudo me foi muito mal / e vós,
filha de don Pai / Moniz, e bem vos parece / de ter eu por vós guarvaia
(guarvaia: roupas luxuosas) / pois eu, minha senhora, como mimo (ou prova
de amor) de vós nunca recebi / algo, mesmo que sem valor.
Cantigas de amor
Nesta cantiga o eu-lirico é masculino e o autor é geralmente
de boa condição social. É uma cantiga mais “palaciana”,
desenvolve-se em cortes e palacios.
Quanto à temática, o amor é a fonte eterna, devendo
ser leal, embora inatingível e sem recompensa. O amante deve ser submetido
à dama, numa vassalagem humilde e paciente, honrando-a com fidelidade,
sempre (Cá entre nós, a época que os homens ainda eram
inteligentes.. : )))
O nome da mulher amada vem oculto por força das regras de mesura (boa
educação extrema) ou para não compromete-la (geralmente,
nas cantigas de amor o eu-lirico é um amante de uma classe social inferior
à da dama).
A beleza da dama enlouquece o trovador e a falta de correspondência
gera a perda do apetite, a insônia e o tormento de amor. Além
disso, a coita amorosa (dor de amor) pode fazer enlouquecer e mesmo matar
o enamorado.
Meus olhos (titulo adp).
Estes meus olhos nunca perderan, / senhor, gran coyta / mentr’ eu vivo fôr;
/ e direy-vos, fremosa mia senhor, / d’estes meus olhos a coyta que an: /
choran e cegan, quand’ alguen que veen.
Guisado teen de nunca perder / meus olhos coyta e meu coraçon, / e
estas coytas, senhos, mias son; / mays los meus olhos, por alguen veer, /
choran e cegan, quand’ alguen non veen, e ora cegan por alguen que veen.
E nunca ja poderey aver ben, / poys que amor já non quer nem quer
Deus; / mays os cativos d’estes olhos meus / morrerán e cegan, quand’
alguen non veen, e ora cegan por alguen que veen.
(Gran coyta: grande paixão desgosto. / Fremosa mia senhor: minha bela
senhora)
Cantigas de amigo
As cantigas de amigo apresentam eu-lirico feminino, embora o autor seja
um homem.
Procuram mostrar a mulher dialogando com sua mãe, com uma amiga ou
com a natureza, sempre preocupada com seu amigo (namorado). Ou ainda, o amigo
é o destinatário do texto, como se a mulher desejasse fazer-lhe
confidências de seu amor. (Mas nunca diretamente a ele. O texto é
dialogado com a natureza, como se o namorado estivesse por perto, a ouvir
as juras de amor). Geralmente destinam-se ao canto e a dança.
A linguagem, comparando-se às cantigas de amor é mais simples
e menos musical pois as cantigas de amigo não se ambientam em palácios
e sim em lugares mais simples e cotidianos.
Conforme a maneira como o assunto é tratado, e conforme o cenário
onde se dá o encontro amoroso, as cantigas de amigo recebem denominações
especiais
-Alvas (quando se passam ao amanhecer):
Levantou-s’a velida (a bela) / Levantou-s’à alva; / e vai lavar camisas
/ e no alto (no rio) / vai-las lavar à alva (de madrugada). – D. Dinis.
-Bailias (quando seu cenário é uma festa onde se dança):
E no sagrado (local sagrado, possivelmente à frente de uma igreja),
em Vigo / bailava corpo velido (uma linda moça) amor ei! – Martim Codax.
– Romarias (sobre visitas a santuários, enquanto as “madres queymam
candeas”):
Pois nossas madres van a San Simon / de Val de Prados candeas queimar (pagar
promessas) / nós, as menininhas, punhemos d’andar (vamos passear).
– Pero de Viviães.
– Barcarolas ou Marinhas (falam do temor de que o “amigo” vá
às expedições marítimas; do perigo de que ele
não volte mais.
Vi eu, mia madr’ , andar / as barcas e no mar, / e moiro de amor! – Nuno
Fernandes Torneol
– Pastorelas (quando seu cenário é o campo, próximo
a rebanhos):
Oi (ouvi) oj’eu ua pastor andar, / du (onde) cavalgava per ua ribeira, /
e o pastor estava i senlheira, (sozinha) / a ascondi-me pola escuitar… –
Airas Nunes de Santiago.
-Gênero satírico: em que o objetivo é criticar alguém,
ridicularizando esta pessoa de forma sutil ou grosseira; a este gênero
pertencem as cantigas de escárnio e as cantigas de maldizer.
São composições que expressam melhor a psicologia do
tempo, onde vêm á tona assuntos que despertam grandes comentários
na época, nas relações sociais dos trovadores; são
sátiras que atingem a vida social e política da época,
sempre num tom de irreverência; são sátiras de grande
riqueza, uma vez que se apresentam num considerável vocabulário,
observando-se, muitas vezes o uso de trocadilhos; fogem às normas rígidas
das cantigas de amor e oferecem novos recursos poéticos.
Os principais temas das cantigas satíricas são: a fuga dos
cavaleiros da guerra, traições, as chacotas e deboches, escândalos
das amas e tecedeiras, pederastia (homossexualismo) e pedofilia (relações
sexuais com crianças), adultério e amores interesseiros e ilícitos.
Obs: Tanto nas cantigas de escárnio quanto nas de maldizer, pode ocorrer
diálogo. Quando isso acontece, a cantiga é denominada tensão
(ou tenção). Pode mostrar a conversa entre a mãe a moça,
uma moça e uma amiga, a moça e a natureza, ou ainda, a discussão
entre um trovador e um jogral, ambos tentando provar que são mais competentes
em sua arte.
Cantigas de Escárnio
Apresentam críticas sutis e bem-humoradas sobre uma pessoa que, sem
ter nome citado, é facilmente reconhecível pelos demais elementos
da sociedade.
Ai, dona fea, fostes-vos queixar / que vos nunca louv’ en [o] meu cantar;
/ mais ora quero fazer um cantar / en que vos loarei toda via; / e vedes como
vos quero loar; / dona fea, velha e sandia!
Dona fea, se Deus me perdon, / pois avedes [a] tan gran coraçon /
que vos eu loe, en esta razon / vos quero loar toda via; / e vedes qual será
a loaçon / dona fea, velha e sandia!
Dona fea, nunca vos eu loei / en meu trobar, pero muito trobei; / mais ora
já un bon cantar farei, / en que vos loarei toda via; / e direi-vos
como vos loarei: dona fea, velha e sandia!
(Loarei: louvarei / Sandia: louca / Avedes tan gran coraçon: tendes
tanto desejo / loaçon: louvor)
Cantigas de Maldizer
Neste tipo de cantiga é feita uma crítica pesada, com intensão
de ofender a pessoa ridicularizada. Há o uso de palavras grosseiras
(palavrões, inclusive) e cita-se o nome ou o cargo da pessoa sobre
quem se faz a sátira:
Maria Peres se mãefestou (confessou) / noutro dia, ca por pecador
(pois pecadora) / se sentiu, e log’ a Nostro Senhor / pormeteu, pelo mal em
que andou, / que tevess’ um clérig’ a seu poder, (um clérigo
em seu poder) / polos pecados que lhi faz fazer / o demo, com que x’ela sempr’andou.
(O demônio, com quem sempre andou)
Mãefestou-se, ca (porque) diz que s’achou / pecador mui’t,(muito pecadora)
porém, rogador / foi log’ a Deus, ca teve por melhor / de guardar a
El ca o que a guardou / E mentre (enquanto) viva diz que quer teer / um clérigo,
com que se defender / possa do demo, que sempre guardou
E pois (depois) que bem seus pecados catou / de sa mor’ ouv (teve) ela gram
pavor / e d’esmolnar ouv’ ela gram sabor (teve grande prazer em esmolar) /
E logo entom um clérico filhou (agarrou ) / e deu-lhe a cama em que
sol jazer (sozinha dormia) / E diz que o terrá mentre (terá
enquanto) viver / e esta fará; todo por Deus filhou. (E isso fará,
pois tudo aceitou por Deus).
E pois que s’este preito ( pacto) começou, / antr’eles ambos ouve
grand’amor. / Antr’el (entre) á sempr’o demo maior / atá que
se Balteira confessou. / Mais pois que viu o clérigo caer, / antre’eles
ambos ouv’i (teve nisso) a perder / o demo, dês que (desde que) s’ela
confessou.
As novelas de cavalaria
Nem só de poesia viveu o Trovadorismo. Também
floresceu um tipo de prosa ficcional, as novelas de cavalaria, originárias
das canções de gesta francesas (narrativas de assuntos guerreiros),
onde havia sempre a presença de heróis cavaleiros que passavam
por situações perigosíssimas para defender o bem e vencer
o mal.
Sobressai nas novelas a presença do cavaleiro medieval, concebido
segundo os padrões da Igreja Católica (por quem luta): ele é
casto, fiel, dedicado, disposto a qualquer sacrifício para defender
a honra cristã. Esta concepção de cavaleiro medieval
opunha-se à do cavaleiro da corte, geralmente sedutor e envolvido em
amores ilícitos. A origem do cavaleiro-heroi das novelas é feudal
e nos remete às Cruzadas: ele está diretamente envolvido na
luta em defesa da Europa Ocidental contra sarracenos, eslavos, magiares e
dinamarqueses, inimigos da cristandade.
As novelas de cavalaria estão divididas em três ciclos e se
classificam pelo tipo de herói que apresentam. Assim, as que apresentam
heróis da mitologia greco-romana são do ciclo Clássico
(novelas que narram a guerra de Tróia, as aventuras de Alexandre, o
grande); as que apresentam o Rei Artur e os cavaleiros da Távola Redonda
pertencem ao ciclo Arturiano ou Bretão (A Demanda do Santo Graal);
as que apresentam o rei Carlos Magno e os doze pares de França são
do ciclo Carolíngeo (a história de Carlos Magno).
Geralmente, as novelas de cavalaria não apresentam uma autoria. Elas
circulavam pela Europa como verdadeira propaganda das Cruzadas, para estimular
a fé cristã e angariar o apoio das populações
ao movimento. As novelas eram tidas em alto apreço e foi muito grande
a sua influência sobre os hábitos e os costumes da população
da época. As novelas Amandis de Gaula e A Demanda do Santo Graal foram
as histórias mais populares que circulavam entre os portugueses.
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